segunda-feira, 27 de julho de 2009

Para quem gosta de passarinho

PARDAIS


Era o São Francisco da praça. Venham a mim os pardais, era o seu lema. Todos os dias ele fazia a caminhada matinal, lançando farelo de milho pros bichos que o acompanhavam em revoada, disputando espaço entre os caminhantes e corredores.
Parece que ele marcava hora com os passarinhos. Eles iam chegando aos poucos, aguardando a ração diária. Cada dia a era maior o número de bicos famintos.
Esse São Francisco estava me incomodando. Pra mim, pardal é rato de asas. Além de agüentar a cachorrada de madame sujando tudo em volta e deixando aquele cheiro, agora tinha que aturar essa raça de piolhentos. Eu adoro a natureza, mas só quando aparece em retratos ou pela tv.
Não sou hipócrita, daqueles que só defendem a Amazônia na mesa de bar, que ficam falando de efeito estufa, reciclagem e coisas gênero, mas adoram queimar gasolina e ir as compras nos shoppings da cidade. Fico doido pra ver essa gente ser levada por um tsunami ou pegar uma virose incurável, pra eles verem o que é a natureza. Sou assim mesmo, adoro a segurança de meu apartamento, tudo sempre muito limpo, higienizado e detetizado três vezes por ano. Planta em casa, só se for de plástico.
Sou muito cioso da minha saúde, vou sempre ao médico, tomo todos os remédios, religiosamente, mas não gosto desse negócio de ginástica, esporte ou algo semelhante. Só comecei a andar na praça, porque levei o maior cartão vermelho na última consulta, era exercício ou enfarte. Gosto de tudo dentro dos horários, de uma boa rotina. Não sei o que seria de mim sem o relógio. Foi dificílimo organizar minha agenda para acomodar mais essa tarefa idiota de dar voltinhas pela praça.
E chega aquele cara pra me tirar do sério. Vê se pode? O pior foi o pesadelo que eu tive com o dito cujo. No início foi até bom, sonhei que estava esganando o amigo dos piolhentos. Mas de repente começou a sair da boca do indivíduo uma montoeira de pardais, e os bichos foram saindo, pousando em tudo quanto era lugar e ocupando todos os espaços. Tinha pardal debaixo da cama, dentro do armário, debaixo do travesseiro, dos lençóis, e foram se imiscuindo pra dentro do meu pijama. Acordei ensopado de suor e tive de tomar três banhos pra tirar a morrinha dos pestilentos.
Depois disto, vi que tinha que tomar uma atitude radical, não havia outro jeito. Mudei meu horário de andar.

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